Luciano Fortunato.
terça-feira, 9 de março de 2010
Quem Sou Eus?
Quem sou eu? Boa pergunta. Sempre sem boas respostas, esta talvez seja a melhor pergunta que qualquer pessoa possa fazer a si. Sei não. Estou aqui pensando que a pergunta mais adequada seria “quem sou Eus?”. Então, quem seria Eus? Eus sou uma multiplicidade de anjos e demônios. Eus sou a multiplicação. Sou a subdivisão. A impossível micro-subdivisão. Sou John Lennon, Bob Dylan, Jimi Hendrix, Caetano Veloso, Che Guevara, Jesus Cristo, O Exterminador do Futuro, um lobisomem, Elvis Presley, Carl Sagan, Steven Spielberg, Woody Allen, Bernardo Bertolucci, Didi Mocó, King Kong, Michael Jackson, Cazuza, Picasso, Adriana Calcanhoto, Renato Russo, José Saramago, sou a Sessão da Tarde, sou o Cine Guanabara, a mulher nua da revista pornô, o homem nu da mesma revista, as páginas coladas da revista pornô com cola viva – momentos emocionantes na vida de qualquer menino –, o menino do rio (não o de Janeiro), sou a bola de borracha nas ruas de paralelepípedo, sou a boa de neve, sou a bola-monstro, sou Speed Racer, sou Bruce Lee, sou o Superman, sou a escola de samba, sou o bobo do pique no pátio da escola, sou o cê-dê-éfe das medalhas de honra ao mérito do Rotary Club, sou o beijo da menina atrás da sala de aula, sou o cheiro do sexo mal lavado dos pré-adolescentes, sou uma estrada estreita e deserta, sou uma onda a quebrar e a voltar e a voltar, o livro de yoga, o gibi da Mônica, sou a vontade do gol, sou o gol chorado do crepúsculo no campo de terra e pouca grama do Jardim, sou Zico, sou Roberto Carlos, sou Raul Seixas, sou o homem da Renascença, sou uma citação de Freud, uma epígrafe, um livro de citações, sou o Menudo, sou a entrevista do talk show, sou o não-filho, sou o pai – e sou pai desde menino – do meu filho imaginário, sou minha filha que é meu materializado fruto, sou a lágrima, sou o olho negro e feliz de um aprendiz alegre, sou uma guitarra, sou um disco de vinil, sou um baseado, sou uma cachoeira, sou uma formiga partida ao meio, sou uma cigarra na mata úmida, sou uma bela mulher que viaja até um homem desconhecido, sou uma revista feminina com conselhos úteis, sou a Bíblia, sou a fé desconfiada, sou o ateísmo que confia nas coisas e pessoas, sou a paixão voluntária de uma necessidade orgânica e ancestral de paixão, a paixão pela paixão, o amor pelo amor, a paixão pela idéia do amor, sou o amor pela idéia da paixão, sou a eterna queixa e o eterno otimismo, sou um infinito indizível, sou o homem invisível, sou um milhão de homens e mulheres, sou indivisível. Sou o nada mais cheio de coisas que eu já conheci.
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